No coração da Cidade do México, uma tempestade midiática está se formando, e seu epicentro é ninguém menos que Ricardo Salinas Pliego, o magnata controverso e dono do império da TV Azteca. Em uma decisão que abalou o cenário televisivo mexicano, Salinas anunciou uma “limpeza” radical na emissora, prometendo demitir todos os funcionários que, segundo ele, promovem o chamado “lenguaje woke” – um termo que ele associa à linguagem inclusiva e a ideologias que considera divisivas. Com a frase “É hora de limpar o México”, Salinas não apenas acendeu um debate nacional, mas também colocou a TV Azteca no centro de uma guerra cultural que está dividindo opiniões e incendiando as redes sociais.
O Contexto da Decisão
A TV Azteca, uma das maiores produtoras de conteúdo em espanhol do mundo, há muito é um pilar da cultura mexicana, oferecendo desde telenovelas dramáticas até programas esportivos e noticiários influentes. No entanto, nos últimos anos, a emissora enfrentou desafios financeiros significativos, com perdas de receita e quedas de audiência, agravadas pela pandemia de Covid-19 e pela concorrência com plataformas digitais. Em 2020, relatórios financeiros indicaram que a empresa perdeu 55,5% de seu fluxo operacional e 8,3% em vendas, resultando em demissões massivas de mais de 14 mil funcionários entre a TV Azteca e a Elektra, outra empresa do grupo Salinas.
Foi nesse cenário de crise que Salinas Pliego, conhecido por sua postura direta e polêmica, voltou sua atenção para o que ele chama de “insensatez” na mídia. Em dezembro de 2024, ele publicou uma carta aberta em sua conta na plataforma X, exigindo que os apresentadores e produtores da TV Azteca abandonassem imediatamente o uso do “lenguaje woke”. Segundo ele, essa linguagem – que inclui termos como “todes”, “todxs” e outras formas de expressão inclusiva – é uma tentativa de “impor ideologias” que não ressoam com a audiência mexicana. “Ser diferente em um mundo cheio de insensatez é valentia”, escreveu Salinas, pedindo que seus colaboradores oferecessem “algo distinto” aos telespectadores.

A Demissão em Massa: Fato ou Retórica?
Embora a narrativa de “demitir todos os funcionários woke” tenha ganhado tração nas redes sociais, a realidade é um pouco mais matizada. Até o momento, não há evidências concretas de uma demissão em massa direcionada exclusivamente a funcionários que usam linguagem inclusiva. No entanto, a TV Azteca tem um histórico de cortes significativos. Em 2020, a emissora dispensou 30% de sua equipe de notícias e esportes, e em julho de 2024, seis apresentadores do programa “Venga la Alegría Fin de Semana” foram demitidos devido a baixos índices de audiência.
A retórica de Salinas, no entanto, é clara: ele quer reposicionar a TV Azteca como uma emissora que rejeita o que ele vê como modismos ideológicos importados. Em sua carta, ele usou um tom satírico, referindo-se aos “televidentes e televidentas” e aos “produtores e productoras”, zombando da linguagem inclusiva que critica. A mensagem ressoou com uma parte da audiência que vê o “woke” como uma imposição cultural, mas também gerou críticas de ativistas e defensores da inclusão, que acusam Salinas de promover discriminação e desrespeitar grupos marginalizados.
O Debate Cultural no México
A controvérsia em torno da decisão de Salinas reflete um debate mais amplo no México sobre linguagem, identidade e o papel da mídia. O termo “woke”, originalmente cunhado na comunidade afro-americana para descrever a consciência sobre injustiças raciais, evoluiu para abranger questões de gênero, inclusão e justiça social. No México, a adoção de formas inclusivas como “todes” ou “latinx” tem sido tanto celebrada quanto ridicularizada, com críticos argumentando que essas expressões são importações anglocêntricas que não se alinham com a língua espanhola.
Para Salinas, a proibição do “lenguaje woke” é uma resposta às demandas dos telespectadores, que, segundo ele, querem uma mídia autêntica e direta. No entanto, críticos apontam que a decisão pode ser uma jogada estratégica para atrair uma base conservadora, especialmente em um momento em que a TV Azteca enfrenta dificuldades financeiras e pressão de acreedores nos Estados Unidos.
Reações e Implicações
As reações à postura de Salinas foram imediatas. Nas redes sociais, hashtags como #TVAzteca e #LenguajeWoke dominaram as discussões, com usuários divididos entre apoio e indignação. Alguns elogiaram Salinas por “resistir à pressão ideológica”, enquanto outros o acusaram de censura e de minar a liberdade de expressão. O governo mexicano, por sua vez, publicou uma explicação sobre o que considera “linguagem sexista” em seu site, destacando a importância de evitar estereótipos de gênero – uma resposta indireta à polêmica.
A longo prazo, a decisão de Salinas pode ter consequências significativas para a TV Azteca. Por um lado, a emissora pode conquistar uma audiência que se sente alienada pelo discurso inclusivo; por outro, corre o risco de perder talentos e alienar anunciantes que valorizam a diversidade. Além disso, a controvérsia destaca a crescente polarização no México, onde questões de linguagem e identidade estão se tornando campos de batalha cultural.
Conclusão: Um México em Transformação
A “sacudida masiva” de Ricardo Salinas Pliego na TV Azteca é mais do que uma decisão corporativa – é um reflexo das tensões que moldam o México contemporâneo. Enquanto o país navega por mudanças sociais, econômicas e culturais, a mídia desempenha um papel central na definição do discurso público. Se a estratégia de Salinas será vista como uma “limpeza” bem-sucedida ou como um passo retrógrado, só o tempo dirá. Por enquanto, a TV Azteca permanece no olho do furacão, e o México assiste, dividido, ao desenrolar dessa história.